Imagine um grande festival de música. Os graves são poderosos o suficiente para serem sentidos no peito. Um DJ mundialmente famoso está tocando uma batida que faz milhares de pessoas movimentarem-se juntas. Este é um evento multimilionário repleto de luz e som. A essência dessa batida poderosa não foi criada em um estúdio moderno. Ela nasceu em uma fábrica de eletrônicos japonesa na década de 1980.
A história da música eletrônica dance (EDM) frequentemente se concentra em artistas de Chicago, Detroit e Nova York. Mas essa história não tem um herói silencioso: o Japão. Antes que a EDM se tornasse um negócio global, empresas japonesas como Roland, Yamaha e Korg estavam construindo as ferramentas que iniciaram uma revolução musical. Elas não estavam tentando criar a trilha sonora para o futuro da vida noturna. Elas estavam apenas construindo máquinas. Ao fazer isso, elas silenciosamente criaram a base para toda a cena da música eletrônica moderna.
Fim dos 70 e início dos 80
No final da década de 1970 e início da década de 1980, a eletrônica japonesa estava crescendo rapidamente. Esse crescimento foi impulsionado pelo foco em engenharia de precisão e aprimoramento constante. Empresas como a Roland queriam criar baterias eletrônicas e sintetizadores. Seu objetivo era fabricar instrumentos confiáveis e acessíveis para músicos.
Suas criações mais famosas foram fracassos comerciais. O motivo era simples: elas não soavam “reais”. Os músicos da época queriam uma bateria eletrônica que soasse como um baterista de verdade. Essas máquinas japonesas soavam diferentes. Soavam robóticas, futuristas e estranhas. É exatamente por isso que se tornaram lendárias.
Tadao Kikumoto é o diretor administrativo sênior da Roland e chefe do centro de P&D. Ele projetou o sintetizador de baixo TB-303 e a bateria eletrônica TR-909.
Três “Fracassos” que Mudaram a Música
A Roland TR-808: A Batida do Hip-Hop e do Electro

A Roland lançou a TR-808 em 1980. Era uma bateria eletrônica programável que permitia aos usuários criar suas próprias batidas. Mas seus sons sintetizados não eram populares. Os críticos chamavam sua bateria de “robótica”. A Roland parou de fabricá-lo depois de vender apenas cerca de 12.000 unidades.
Então, algo interessante aconteceu. Os 808s descontinuados apareceram em lojas de penhores e ficaram muito baratos. Isso permitiu que uma nova geração de artistas underground nos EUA os comprasse. Esses artistas não tinham condições de comprar as caras e “realistas” drum machines. Em 1982, 2 Afrika Bambaataa & The Soulsonic Force usaram um 808 para criar a batida de “Planet Rock”. Um novo gênero, o electro, nasceu. O bumbo profundo e estrondoso do 808 tornou-se a assinatura sonora do hip-hop, usado por artistas de Run-D.M.C. a Kanye West.
Roland TR-909: A Pulsação do House e do Techno

A Roland tentou novamente em 1983 com o TR-909. Era mais avançado e utilizava pequenas amostras digitais para seus pratos. Mas ainda não soava “real” o suficiente para o mercado mainstream. Assim como o 808, foi descontinuado após vender apenas 10.000 unidades.
Mais uma vez, esse fracasso levou ao sucesso criativo. Os 909 baratos e usados foram comprados por produtores de Chicago e Detroit. Seu bumbo potente e seus chimbais afiados tornaram-se a batida constante e ritmada da house music e a pulsação do techno. Faixas como “Strings of Life”, de Derrick May, e “Can You Feel It”, de Mr. Fingers, são impulsionadas pelo som do 909. Esse som define a dance music até hoje.
O Roland TB-303: O Som Acidental do Acid

A história do TB-303 é a mais improvável de todas. Esta pequena caixa prateada foi projetada em 1982 como uma ferramenta de prática. Era para substituir um baixista. Foi um fracasso completo. Não soava nada como um baixo. Produzia um ruído estranho, “estridente”, e era muito difícil de programar.
O TB-303 foi rapidamente esquecido e vendido em baús de pechinchas. Um grupo de Chicago chamado Phuture encontrou um por um preço muito baixo. Eles não sabiam como programá-lo, então simplesmente começaram a girar os botões enquanto uma sequência tocava. O som selvagem e fluido resultante era completamente novo. Eles o usaram em uma faixa chamada “Acid Tracks”. Um gênero inteiro, o acid house, nasceu por acidente.
De uma Fábrica Silenciosa para uma Cena Global
O fator-chave nesta história é a acessibilidade. Empresas americanas e europeias construíram equipamentos caríssimos para músicos famosos. Fabricantes japoneses, sem querer, tornaram a produção musical acessível a todos. Seus produtos “fracassados” tornaram-se tão acessíveis que permitiram que jovens artistas nas cidades criassem novos gêneros musicais.
Hoje, esses sons “irrealistas” e “robóticos” são o padrão. O “bump 808” é usado em tudo, do trap à música pop. A pulsação do 909 é o padrão para a maioria dos gêneros house e techno. Todos os softwares de música modernos incluem versões digitais dessas máquinas clássicas.
Então, da próxima vez que você ouvir essa batida em um festival, lembre-se dos engenheiros silenciosos do Japão. Eles podem não ter planejado começar uma festa global. Mas, ao projetar alguns fracassos bem-sucedidos, eles deram voz à música eletrônica. O papel do Japão na história da EDM não é apenas um pequeno detalhe. É a própria batida.
1 comentário
Os japoneses sempre a frente do tempo né..incrível. !!!!